sábado, 23 de dezembro de 2017

Febre




“_Hilda, o que é escrever pra você?"

_Não tenho a menor ideia. É muito difícil. Às vezes é uma inspiração súbita que te dá. Mas também é muito difícil. A gente fica, chega a ficar com febre, com febre mesmo.”

                                                      ( Entrevista Hilda Hilst, 2002)


Então alguma coisa da escrita é febre. Alguma coisa da escrita acontece nessa experiência intensa de afetos: do afetar e do deixar afetar-se. O afeto no exercício de desdobrar paisagens é o peso, desequilíbrio que impulsiona o movimento.

Recebo afetos como água que precisa circular. Toda água parada em mim me adoece. A escrita vem nesse fluxo... A escrita movimenta. É como o trânsito de muitas personagens e paisagens febris que compõem todos os lugares. Porque pra que as coisas existam, mesmo as coisas comuns, é preciso que haja uma costura fina de febre, e doença, e estranhezas.

É preciso que haja um mundo fantástico na substância do real. O escritor é aquele que consegue ver esse mundo vivo, esse movimento de febre que transpõe a dureza do real.

Ana G. Rebelo
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